quinta-feira, 27 de maio de 2010

Fugir para o mar



Desde bem pequena eu escuto meu pai contar para todos a história da primeira vez que ele me levou para ver o mar. De acordo com suas lembranças eu devia ter uns 2 ou 3 anos e estávamos em viagem pelo sul do país, não me lembro agora se era o litoral de Santa Catarina ou do Paraná, e estávamos em qualquer outra estação do ano, que não o verão, logo as águas do sul estavam gélidas. O fato é que, segundo meu pai, assim que chegamos à praia ele tirou meus sapatos e me deixou com os pés na areia. Depois de tirados os sapatos não deu mais para segurar, corri desenfreada para o mar, fazendo com que a mãe, sempre mais responsável que o pai, corresse nervosa logo atrás com medo de onde esse desatino pudesse acabar. Os dois dizem que eu era pura euforia. Minutos depois veio a tentativa de me tirar do mar. Meu pai tentou o mais obvio: comida! “Filha vamos almoçar”, “EU JÁ ALMOCEI”, enfática e tinhosa, sinais claros de como viria a ser depois de crescida. Foram várias tentativas de negociação, todas frustradas. Obviamente, devido à pouco idade, não me lembro deste dia, mas posso imaginar a alegria, a sensação de liberdade daquele breve momento e vocês querem que eu saia de lá para ALMOÇAR? Nãnãninãnão, nada feito, nem pensar! Ufff pena que criança não tem a última palavra. Fui arrastada aos prantos para fora do mar.


Bom...Mais de 20 anos se passaram e ainda corro para o mar como uma criança, desenfreada, apaixonada e encantada por aquela imensidão. Parece obvio, mas, por mais estranho que isso soe aos meus ouvidos, tem gente que não gosta de praia. (OLHOS ARREGALADOS), é, assim mesmo, não gostam. Minha irmã mesmo, sangue do mesmo sangue, não é a maior fã. Dizem que a areia pinica, que o sal gruda, que o sol queima e que a água gela. SIM, a areia pinica, SIM, o sal gruda, SIM o sol queima e SIM a água gela, e tudo isso faz parte dessa experiência divina (no sentido literal da palavra) que me faz sentir viva.


Dito isso vou contar para vocês sobre a minha mais nova empreitada, o surf! No fim de 2009, atolada em trabalho, estresse, cansaço e insatisfação meu corpo começou a reclamar. Dores e mal estar que culminaram em uma alergia sem fim. Sim, alergia do trabalho, hahahahahaha. Fui para a Bahia de férias...Praia do Forte...lá percebi que o real motivo de toda aquela alergia era minha insatisfação com a vida que estava levando. Ok, de volta a São Paulo, o que fazer? Vou aprender a surfar! Sob olhares e comentários surpresos, sarcásticos e desanimadores decidi que esta seria minha meta em 2010. Não uma brincadeira, uma vontade passageira, mas uma meta. No carnaval o primeiro passo, ou melhor, o primeiro caldo. Fui viajar com uma grande amiga, amiga que me ensinou muita coisa e que me inspirava a me aventurar no surf, já que, ela mesma transbordava alegria em cima de uma pranchinha 6’4’’. Deixa os marmanjos todas boquiabertos.


Bom, com a prancha emprestada cai no mar de Itamambúca, Ubatuba. Vou confidenciar: nunca pensei que fosse tão difícil. Mal consegui me deitar na prancha, as remadas sofridas eram interrompidas pelas ondas que me arrastavam de volta à areia. Pensaram que eu ia desistir. Pensei em desistir. Mas sou leonina, e você já viu um leonino desistir? RA-RA-RA. Eis que, após horas de afogamentos, um surfista me diz: “Quer ajuda?”. PORRA, MAS É CLARO QUE EU QUERO AJUDA, ESTOU ME AFOGANDO AQUI, ME MATANDO DE REMAR SEM SAIR DO LUGAR ENQUANTO TODOS RIEM DA MINHA CARA, SIM EU QUERO AJUDA! ... Não, eu não respondi isso, mas juro que pensei! A resposta real foi: “Por favor”. Aos risos o moço diz: “Larga a prancha e nada, mas nada como se você estivesse sendo perseguida por tubarões brancos famintos” (Ok gente, ele foi didático). Nadei, nadei, nadei, nadei, e quando vi, estava lá, do lado dos surfistas, tentando sentar na prancha, que mais parecia um touro mecânico. Eu não tinha mais ar, meus músculos doíam, minhas costas ardiam, mas eu não estava nem um pouco afim de desistir, ainda mais agora, que já estava ali. Determinada remei em direção a uma onda. Alguns diriam “eu peguei minha primeira onda”, no meu caso foi “a primeira onda me pegou”. Deitada, sem nem me atrever a tentar levantar, desci aquela onda. Naquela hora TUDO valeu a pena, a dor, o cansaço, o desconforto, a vergonha, o medo. Em cima daquela prancha eu só senti o vento, a velocidade, o mar, uma plenitude, uma solidão, não daquelas tristes, mas daquelas que te fazem sentir único, fazem sentir que aquele momento é só seu, de mais ninguém.


Deste momento em diante soube com toda certeza que queria mais daquilo, queria sentir de novo aquela sensação, mais e mais vezes. Encontrei uma escola de surf, me matriculei e lá fui eu a mais pangaré de todas as surfistas. Vou avançar a fita para vocês não se cansarem da história (se é que já não cansaram)...comecei no long, o pranchão, caí, caí, caí, caí, caí (multipliquem esta palavra infinitamente)...FIQUEI EM PÉ! Passei a pegar ondas maiores. Caí, caí, caí, caí....FIQUEI EM PÉ! Passei para uma prancha menor, a fan, caí, caí, caí, caí, caí, me afoguei, tomei caldo, caí, caí....FIQUEI EM PÉ!


No sábado retrasado tomei o maior caldo da minha vida, juro que achei que fosse morrer, me senti dentro de uma máquina de lavar, nem sabia mais pra que lado estava o ar e para que lado estava o mar...mas também peguei a maior onda da minha vida...naqueles breves segundos, quando o mundo é todo seu, todo o resto perde a importância e você fica bem perto de Deus.



Todos os finais semanas agora são dedicados ao surf, portanto, aguardem novas histórias, podem rir, porque com certeza ainda vou cair, cair, cair, cair e cair...como criança que corre desenfreada para o mar.

2 comentários:

André Brito disse...

Vê o mar e sai correndo? Parece coisa de mineiro isso, rs...

Melhor do que minha primeira vez que fiz meu pai encher uma piscina com agua do mar (já viu né, corri e na primeira onda, primeiro caldo entendi que eu era povo de montanha).

Beijo paulista

Unknown disse...

Minha primeira vez foi um pouco diferente, eu tinha 12 ou 13 anos e tinha uma galera empolgada falando das manobras que eles estavam tirando em cima de uma prancha(manobras que ninguem via) um dizia: fulano viu! e fulano respondia: vi não! eu onlhando pensei: Vou surfar tambem! e vou manobrar de verdade! Peguei um bodyboard emprestado e fui correndo pra praia, quando dei a primeira braçada uma agua-viva grudou em meu pescoço! kkkkk sai berrando do mar, mas n desisti e no dia seguinte (com o pescoço inchado) fui com uma prancha e logo de cara fiquei em pé, nunca vou esquecer! e a sua descrição da primeira ver que desceu uma onda é PERFEITA! Tive exatamente a mesma sensação, Liberdade, Vida e encontro Divino!Hoje Surfo a 14 anos e Parabéns!!! Vc ja é uma surfista de alma!!!